Como é cediço, estamos vivendo um momento atípico que demanda maior atividade na administração pública no intuito de promover a saúde da população em meio à crise pandêmica.
É necessário que o Estado – lato sensu – promova contratações para agregar bem e serviços aos entes pública, uma vez que a pandemia ocasionou um elevado número de contágio, aumentando significativamente as demandas na área de saúde.
Em se tratando de fato imprevisível, o sistema de saúde não estava preparado para receber as demandas oriundas do covid-19, principalmente pela particularidade de um dos sintomas do vírus – inflamação nos pulmões – exigindo respiradores mecânicos para tratamento dos casos de maior gravidade. Além disso, surgiu a necessidade de contratação de prestadores de serviços para atender demandas como construção dos hospitais de campanha, por exemplo.
Em razão das necessidades da administração pública em adquirir produtos e contratar serviços para suprir as suas carências, imprescindível, para tanto, instauração de processo de licitação, que é o instrumento legal colocado à sua disposição para fazer as escolhas das referidas contratações.
A licitação tem como propósito principal a busca pelas melhores condições, destinando-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, impessoalidade e legalidade. É procedimento administrativo pelo qual um ente público, no exercício da sua função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para celebração do contrato.
Entretanto, há exceções que permitem fugir à regra e realizar outras formas de contratação perante a administração pública, sendo uma delas a dispensa a licitação.
Com isso em mente, o artigo 24, inciso IV da Lei nº 8.666/93 dispõe que:
“IV – nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos”.
Note que é plenamente aplicável a dispensa nos casos de calamidade pública, desde que, obviamente, o objeto da licitação dispensada tenha correlação com a calamidade decretada. Deve-se, todavia, elucidar que para que se permita a contratação direta por dispensa de licitação no presente caso, necessário restar comprovado substancialmente que a proposta ofertada é a mais vantajosa para a administração, bem como que a demonstração do valor contratado é equivalente ao praticado no mercado.
Daí como dito em linhas anteriores, diante da excepcionalidade da atual pandemia, foi editado, em 06 de fevereiro de 2020, a Lei de nº 13.979 que traz como principal objetivo, definindo no seu artigo primeiro, as medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.
Ainda que frua legislação geral em nosso ordenamento jurídico versando acerca da matéria – dispensa a licitação – se fez necessário legislação provisória para ampliar as condições de utilização do referido instituo da dispensa.
Lá no artigo 4º da lei 13.797, surgiu a possibilidade de dispensa a licitação para aquisição de bens, serviços, inclusive de engenharia, e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus de que trata esta Lei.
Logo no parágrafo primeiro há disposição da temporariedade da aplicação das medidas, sendo o encargo, enquanto perdurar a emergência de saúde pública.
Imperioso registrar, ainda, que a Lei 13.797/20 traz algumas distinções em relação a Lei Geral de Licitação – n° 8.666/93. Em razão disto a Lei 13.797/20 possui natureza provisória, para atender as demandas relacionadas tão unicamente ao combate do Covid-19, bem como os contratos regidos pela referida Lei terão prazo de duração de até seis meses e poderão ser prorrogados por períodos sucessivos, enquanto perdurar a necessidade de enfrentamento dos efeitos da situação de emergência de saúde pública.
Ora, a título exemplificativo, há previsão de isenção da estimativa de preço na dispensa, desde que justificado pala autoridade competente, bem como na hipótese de haver restrição de fornecedores ou prestadores de serviço, a autoridade competente, excepcionalmente e mediante justificativa, poderá dispensar a apresentação de documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista ou, ainda, o cumprimento de um ou mais requisitos de habilitação.
Em razão dessas excepcionalidades, para garantir lisura nos procedimentos, o parágrafo segundo afirma que todas as contratações ou aquisições realizadas com fulcro nesta Lei serão imediatamente disponibilizadas em sítio oficial específico na rede mundial de computadores (internet), contendo, no que couber, além das informações com o nome do contratado, o número de sua inscrição na Receita Federal do Brasil, o prazo contratual, o valor e o respectivo processo de contratação ou aquisição.
Diante da gravidade, a situação exige medidas céleres da administração pública para enfrentar os problemas ocasionados pela pandemia, é notório, pois, que esperar o trâmite de todo um processo licitatório, que requer um tempo razoável, para adoção de medidas em combate ao vírus não seria o modo mais adequado.
Um ponto que merece destaque, em razão da inovação, é a possibilidade da utilização do sistema de registro de preço pelo instituto da dispensa a licitação. É que o sistema de registro regulamentado, pelo Decreto n° 7.892/2013, prever, apenas, a possibilidade de utilização da referida modalidade na concorrência e pregão.
Em sendo assim, denota-se, portanto, que as contratações associadas ao confronto do coronavirus devem ser pautadas a partir das hipóteses previstas na Lei nº 13.979/2020, a saber: a) dispensa de licitação – art. 4º; b) realização de Pregão, preferencialmente eletrônico, com prazos procedimentais reduzidos à metade – art. 4º-G; ou c) execução de despesas via suprimento de fundos, as quais tiveram seus limites de valor ampliados – art. 6º-A.
Nesse período anômalo com reflexo, inclusive, no comportamento econômico, restará ao gestor maior criatividade no enfrentamento da pandemia para tratar das questões de saúde e economia.
Por Breno Carvalho.